segunda-feira, 28 de maio de 2007

Hydesville, EUA, 1848


Em 1938 o jovem norte-americano Orson Welles, de apenas 23 anos, provocou pânico em milhares de ouvintes de um programa de rádio em Nova York ao anunciar a invasão da Terra por seres de outros planetas. A simulação foi tão realista e de tamanha repercussão que o governo dos EUA teve que rever sua política de divulgação de informações para o público. O autor da proeza, um talentoso diretor que se tornaria uma lenda do Cinema em Hollywood, tinha usado uma estratégia criativa para chamar a atenção da opinião pública, usando a probabilidade do planeta vir a ser invadido por seres extraterrestres. Se houve pânico é porque a idéia de uma invasão interplanetária não seria tão absurda, embora já fosse largamente explorada pela ficção científica. Mas a ficção científica nem sempre foi sinônimo de absurdo. Quem leu Júlio Verne, e todas as gerações de escritores que o sucederam, sabe que a maioria das suas criações “imaginárias” acabou se tornando realidade.
A estratégia de Welles realmente foi muito criativa, funcionou como fenômeno de audiência e feed-back, mas não foi tão inédita como geralmente é divulgada atualmente. Noventa anos antes, em 1848, a população do pequeno povoado de Hydesville, próximo a Rochester, no Estado de Nova York, não entrou em pânico, mas teve uma reação de espanto incomum por causa da invasão de seres de outros mundos. A notícia logo se espalhou por toda a região tomando conta do país e do resto do planeta. Mais tarde percebeu-se que era também uma estratégia de comunicação para chamar a atenção da Sociedade. Aquela ampla região já era conhecida como o Distrito Inflamado (Burned-over District), pela efervescência de surtos de religiosidade e ardor social, com o aparecimento de seitas, movimentos radicais e eventos sobrenaturais. Diferente dos seres anunciados por Welles, os do povoado de Hydesville não eram fictícios; não tinham aparência esdrúxula como as que o escritor H. G. Wells havia descrito na sua ficção “A Guerra dos Mundos”, da qual Orson Welles havia extraído o conteúdo assustador do seu programa radiofônico. Os seres, como os de Hydesville, eram ainda mais assustadores do que os que foram anunciados no rádio, sobretudo porque eram invisíveis aos olhos comuns; manifestavam-se através de pancadas nas paredes e se comunicavam através de toques rudimentares, raps, mais tarde transformados em linguagem alfabética. O fenômeno de comunicação de Orson Welles durou poucos minutos e suas conseqüências de longo prazo seriam apenas de valor estético para os aficionados em técnicas de comunicação. Já o fenômeno de Hydesville duraria semanas sucessivas e dali se espalharia, em sincronia, para outros continentes, gerando efeitos que foram muito mais além das questões técnicas e estéticas.
Os seres de Hydesville eram Espíritos, seres inteligentes que estavam invadindo a terra com a clara intenção de causar espanto e curiosidade. A estratégia deles era mexer com a imaginação popular, causar um choque no senso comum das pessoas e sacudir toda a estrutura de conhecimentos teológicos e científicos dominantes no mundo contemporâneo. Para tanto, apelaram para o impacto dos fenômenos paranormais. Novidade? Não! Isso já havia acontecido no passado em outros eventos históricos de grande repercussão como este. Em 1744, o sueco Emmanuel Swedenborg fez, em Londres, alguns relatos muitos claros sobre suas experiências como mundo invisível:

“Uma noite o mundo dos Espíritos, céu e inferno, se abriu para mim, e nele encontrei várias pessoas conhecidas, em diferentes condições. Desde então o Senhor abria diariamente os olhos do meu espírito para que eu visse, em perfeito estado de vigília, o que se passava no outro mundo, e pudesse conversar, em plena consciência, com os anjos e os espíritos.”

Em 1831, na Escócia, o pastor Edward Irving registrou em sua igreja um fenômeno semelhante ao episódio bíblico do Pentecostes, no qual os adeptos falavam simultaneamente idiomas desconhecidos entre eles. Na Califórnia, em 1837, um grupo de protestantes ingleses ali estabelecido, a Sociedade Unida dos Crentes no Segundo Advento do Cristo, apelidado de “shakers” (os que se agitavam numa dança coletiva), passou a ser abordado por Espíritos de índios pele-vermelha, que se manifestavam através dos próprios colonos e eram por estes “evangelizados”, num processo de intercâmbio e doutrinação que futuramente se tornaria muito comum nos centros espíritas. Esses fenômenos foram relatados em detalhes por Sir Arthur Conan Doyle[1], que os chamou apropriadamente de “invasão organizada”. Após sete anos consecutivos de intercâmbios, os Espíritos peles-vermelhas disseram que iriam se retirar, mas que voltariam numa invasão maior, em todo o mundo. Quatro anos depois, a principal testemunha desses acontecimentos, o pastor shaker Elder Evans, soube dos fenômenos de Hydesville e para lá se dirigiu com a intenção confirmar em público a veracidade do que estava acontecendo. Doyle lembra também que outro fato curioso estabeleceu a ligação entre esses fenômenos: Andrew Jackson Davis, um conhecido médium norte-americano, em 6 de março de 1844, foi desdobrado do corpo físico e levado às montanhas de Catskill, a quarenta milhas de distância de sua casa, e ali encontrou-se com os Espíritos do médico grego Galeno e de Emmanuel Swedenborg. Quatro anos mais tarde escreveria uma nota profética no seu diário, em 31 de março de 1848, a mesma data dos eventos na residência da família Fox:
“Esta madrugada um sopro quente passou pela minha face e ouvi uma voz suave e forte dizer: ‘Irmão, um bom trabalho foi começado. Olha, surgiu uma demonstração viva!’ - fiquei pensando o que queria dizer essa mensagem”. Andrew Jackson Davis, 31 de março de 1840
[1] História do Espiritismo. Ed. Pensamento.

Sumário da obra



Introdução – Construindo uma História Espírita - Allan Kardec e a História do Espiritismo.

Livro I – O Encontro dos Mundos - A Tradição e o Dogma - O Tráfico e a Traição - O Investigador - Mesas que giram e falam - As Inteligências do Além - O Medo da Morte. – A Iniciação e o Erro - Cinco Encontros “casuais”- Zéphyr e a Evocação de Sócrates- Contra o Totalitarismo- Apóstolos da Idéia - A Fúria do Clero - O Auto-de-fé na Espanha - A Maçonaria - O Socialismo - As pedras vão falar - Mudanças à Vista - O perigo da clericalização - Evangélicos e Protestantes.

Livro II – Um Século Perigoso - A Cidade-Luz - Uma Época de Desencanto - Deus e o Super-Homem - O Declínio da Igreja - O Espiritismo banido da História.

Livro III - A Razão e a Bíblia - A Palavra de Deus - O Terceiro Testamento - Os vivos e os mortos - O Espírito Verdade - A Identidade do Espírito - Espiritismo e Esoterismo - O Pentateuco Kardequiano - A Base Doutrinária: O Livro dos Espíritos - A Prova Científica: O Livro dos Médiuns – A Moral: O Evangelho segundo o Espiritismo - A Justiça Divina: O Céu e o Inferno - As Origens e o Destino: A Gênese.

Livro IV – O Movimento Espírita - Os Seis Períodos do Espiritismo - A “Revue Spirite” - A Sociedade Espírita de Paris- Quem eram os Espíritas – Estatística do Espiritismo - Da França ao Brasil - A Falange de Benoît-Jules Mure - João do Rio e a Federação - Semelhanças e Diferenças - Kardec “Espírito” se comunica - Os Puros e os Impuros - O problema do Sectarismo - Quem somos? Para onde vamos?

Livro V - Os Apóstolos do Cruzeiro – O Apóstolo de Sacramento - O Bandeirante do Espiritismo - O Médico dos Pobres - O Guia Ismael e a Trindade “Deus, Cristo e Caridade” - Anália Emília Franco.

Livro VI – A Era Chico Xavier - Nos tempos do Comandante - A Revolução Andragógica – Existe uma pedagogia espírita? - Armond e a Revolução Assistencial - O Ideal de Fraternidade - Da FEESP à Aliança - O Ideal de Unificação - As Controvérsias Doutrinárias - O Apóstolo de Uberaba.

Livro VII – O Futuro do Espiritismo – O Meio e a Mensagem - O Triunfo de Tomé - A Fé Raciocinada - A Busca da Verdade – O Reconstrutor da Fé - Imagens e Palavras - Católicos, Protestantes e Espíritas - O Espiritismo e a Nova Humanidade – A Educação Social Espírita – Espiritismo e a Pós-Modernidade. A Degeneração do Espiritismo.


Cronologia e Contexto - Os principais acontecimentos de 1733, com o nascimento do magnetizador Fraz Anton Mesmer, até 1869, com o desencarne de Allan Kardec; e de 1870, com a Guerra Franco-Prussiana até 2000, com o desencaarne do médium brasileiro Francisco Cândido Xavier.

O que deve ser a História do Espiritismo

“A propósito dessa história, sobre a qual dissemos algumas palavras, várias pessoas nos perguntaram o que compreenderia ela e, a propósito, nos enviaram diversos relatos de manifestações. Aos que pensaram assim trazer uma pedra ao edifício, agradecemos a intenção, mas diremos que se trata de algo mais sério que um catálogo de fenômenos espíritas, encontradiço em muitas obras.

Tendo que se destacar o Espiritismo nos fastos da humanidade, será interessante para as gerações futuras saber porque meios ter-se-á ele se estabelecido. Será, pois, a história das peripécias que tiverem assinalado os seus primeiros passos; das lutas que tiver enfrentado; dos entraves que lhe terão oposto; de sua marcha progressiva no mundo inteiro. O verdadeiro mérito é modesto e não busca fazer-se valer. É preciso que a humanidade conheça os nomes dos primeiros pioneiros da obra, daqueles cuja abnegação e devotamento merecerão ser inscritos em seus anais; das cidades que marcharam na vanguarda; dos que sofreram pela causa, a fim de que os abençoem; e dos que fizeram sofrer, a fim de que orem, para que sejam perdoados; numa palavra, de seus amigos dedicados e de seus inimigos confessos ou ocultos. É preciso que a intriga e a ambição não usurpem o lugar que lhes pertence, nem um reconhecimento e uma honra que lhes não são devidos. Se há Judas, devem ser desmascarados. Uma parte que não será menos importante é a das revelações que, seguidamente, anunciaram todas as fases dessa nova era e os acontecimentos de toda a ordem, que as acompanharam.

Aos que achassem a tarefa presunçosa, diremos que não temos outro mérito senão o de possuir, por nossa posição excepcional, documentos que não pertencem a ninguém e que estão ao abrigo de quaisquer eventualidades; que, incontestavelmente, estando o Espiritismo sendo chamado a desempenhar um grande papel na História, importa que seu papel não seja desnaturado, e opor uma história autêntica às histórias apócrifas que o interesse pessoal poderia fabricar.

Quando aparecerá ela? Não será tão cedo e talvez não em nossa encarnação, pois não se destina a satisfazer a curiosidade do momento. Se dela falamos por antecipação, é para que ninguém se equivoque quanto ao seu objetivo e seja anotada a nossa intenção. Aliás, o Espiritismo está em começo e muitas outras coisas terão passado até lá. Então, é preciso esperar que cada um tenha tomado o seu lugar, certo ou errado.”

“O que deve ser a História do Espiritismo” - Revista Espírita – ANO V, outubro de 1862

Obra de pesquisa e reflexão


Finalmente, depois de 80 anos, o Espiritismo e o Movimento Espírita são alvos de uma nova abordagem historiográfica. Não é a história oficial das entidades dirigentes espíritas, pois esta não nunca existiu e nunca vai existir, a não ser que o movimento espírita perca o juízo e o bom senso kardecista e siga os passos do catolicismo ou das religiões de Estado. As entidades federativas espíritas sempre foram livres e independentes entre si e, ideologicamente, sempre buscaram uma unificação pelas semelhanças e não pelas diferenças, muito menos a pretensão de domínio e monopólio político. Todas elas reconhecem historicamente a França e as experiências de Allan Kardec na Sociedade de Estudos Espíritas de Paris como a raiz e palco da fundação do Espiritismo. Esse reconhecimento se estende aos fatos e personagens que ao longo dos últimos 150 anos construíram a memória social do movimento espírita. Também a historiografia espírita é livre e independente e sua validade será ou não reconhecida pela sua abordagem compreensível e coerente com a realidade dos fatos.
Diferente da obra clássica de Arthur Conan Doyle, que realçou a fase fenomênica e colocou Allan Kardec e o período filosófico em segundo plano, essa nova historiografia pretende pôr alguns fatos e personagens nos seus devidos lugares. A razão do equívoco histórico é que Conan Doyle, como a maioria dos ingleses e norte-americanos da sua época, não fizeram, como fez Kardec, a distinção entre espiritualismo e espiritismo. Para ele tudo era “spiritualism” e a reencarnação seria apenas um detalhe dessa nova revelação. A história mostrou o contrário: as idéias de Kardec tinham uma visão mais ampla e realista desses acontecimentos e sua sistematização como ciência e doutrina filosófica sobreviveram ao tempo, enquanto as tendências do “spiritualism” se fragmentaram. O problema é que se passaram quase cem anos e o Movimento Espírita tomou novos rumos que nem o próprio Allan Kardec imaginava. Surgiram novas tendências, as naturais divergências e a busca da convergência. Essa segunda parte da história não foi contada por Conan Doyle. E nem poderia, já que a maioria dos acontecimentos marcantes ainda estava por vir e bastante fora daquele contexto eurocêntrico da Belle Époque. Por exemplo: o Espiritismo desapareceu da França e explodiu no Brasil como opção religiosa de milhões de adeptos no século 20. Nesse novo capítulo da história espírita mundial o médium brasileiro Chico Xavier torna-se a figura mais expressiva do movimento kardecista e sua obra literária brilha como a principal referência doutrinária em relação aos livros de Allan Kardec. Chico chega a ser apontado por adeptos mais afoitos como a reencarnação do próprio Kardec, em missão existencial complementar. A Federação Espírita Brasileira e muitas outras entidades federativas vão assumindo as rédeas da propaganda e das diretrizes do movimento através da ação de inúmeros médiuns e influentes líderes espíritas, de múltiplas concepções e tendências sobre a filosofia espírita. E finalmente, no início do século 21, o Brasil configura-se como a principal nação espírita do mundo e uma das principais culturas reencarnacionistas do planeta.
Essa é síntese exposta nos sete capítulos da Nova História do Espiritismo – dos precursores de Allan Kardec até Chico Xavier, do historiador e educador Dalmo Duque dos Santos. O autor já publicou dois livros pela Editora DPL e é relativamente conhecido por seus artigos publicados em sites espíritas. Outra novidade é que a publicação não vem com o selo de nenhuma editora tradicional e sim a marca da edição alternativa, criada pelas editoras-gráficas do sistema print-of-demand. Nessa nova tendência editorial o autor é o principal investidor e divulgador da sua obra. Isso significa que o livro não vai ser encontrado nas livrarias, nem em clubes do livro, pois a tiragem é limitada e oferecida diretamente ao consumidor pela internet ou por telefone. Nesse caso a publicação foi feita pela Editora Corifeu, do Rio de Janeiro. A Nova História do Espiritismo tem 402 páginas, custa 65 reais, já incluído o frete. Vendas pelo site www.corifeu.com.br ) ou pelo telefone (5521) 3416-1358. E-mail do autor: dalmoduque@ibest.com.br.